quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Nas Asas do Medo

Desde que me entendo por gente sempre tive pavor de altura, o que muitas vezes me causou sérios problemas e constrangimentos. Não me sai da lembrança uma cena de infância: para agradar os amiguinhos da rua em que morava em Ribeirão Preto, decidi subir com meus companheiros de aventura no telhado do caramanchão* da casa onde vivia para fazer uma guerra de limões.

A batalha foi árdua. Não a dos limões - que me custou um nariz ensanguentado -, mas para me convencerem a descer de uma altura de não mais de três metros. Foi minha primeira experiência de pânico verdadeiro, aquela sensação de terror que petrifica. E assim eu fiquei em cima do caramanchão, palavra em desuso que já soava estranha naquela época e hoje me traz recordações constrangedoras. Não desci. Após inúmeras tentativas, fui “salva” por um vizinho que assumiu o papel de herói e me retirou em seus braços daquele lugar aterrorizante.

Naquele momento, prometi a mim mesma que jamais voltaria a ficar nas alturas. Por isso, nunca tive o sonho de qualquer menina dos anos 70 de ser aeromoça – sim, gente, estas profissionais ainda não era chamadas de comissárias, palavra que, por sinal, parece ter muito menos glamour.

Assim, meus sonhos profissionais sempre foram muito “pé no chão, falando literalmente. Optei pelo curso de Comunicação – Relações Públicas sem imaginar o quanto teria que desafiar com maestria o meu medo na minha rotina de trabalho.

Aliás, comecei a pensar neste tema em uma viagem recente. De avião, é claro. Até para que o pavor se diluísse durante aquelas duas horas de voo, comecei a relembrar e dar boas risadas de todas as aventuras e desventuras que passei desde que comecei a trabalhar na LVBA, há 20 anos.

São tantas histórias no ar que sinto até orgulho de nunca, jamais, ter perdido a classe e a compostura como fiz na época do caramanchão. Ao longo dos anos, passei por verdadeiros tratamentos de choque pelos céus desse mundo. No início de carreira, sempre fui escalada para cobrir eventos dentro e fora do país. E lá ia eu, orando – apesar de pouco crente –, para as mais diversas paradas.

A grande questão, em alguns momentos, não é voar, mas em que tipo de aeronave, se algumas podem ser chamadas assim. Conheço inúmeras e não há psicanalista que me convença de que meu medo não é real ao estar sentada numa micropoltrona de um Bandeirantes num dia de chuva, que mais sacudia do que voava. E a sensação – compartilhada por um grupo de jornalistas – não é melhor em um Brasília.

Mas a pior viagem da minha vida foi a bordo de um Fokker 50, rumo ao interior de Minas Gerais. O que seria um voo de duas horas transformou-se num inferno de quatro horas e meia. O pânico e o mal-estar não tomaram conta apenas de mim, mas de todo o grupo de executivos que eu acompanhava. Só que esta confissão foi feita apenas em solo, quando muitos precisaram de uma ajuda extra para se recompor, inclusive eu.

Esses “causos” aconteceram há uns quinze anos, pelo menos. E atualmente sou muito grata à evolução do mercado de aviação, principalmente no Brasil. Hoje, mesmo para os lugares mais longínquos, o máximo que terei que encarar é a nova geração de aviões turbo-hélices, que, segundo informações do setor, são extremamente seguros. Dados que não me tranquilizam totalmente ao passar por uma turbulência ou por problemas mecânicos.

Escrevo estas linhas já com as malas prontas para as próximas viagens profissionais e pessoais que acontecem até o fim do ano. Claro que o medo de altura e o desconforto com aviões persistem, sejam eles ultramodernos ou não. Também tenho certeza que é um problema que me acompanhará por toda a vida. No entanto, essas “andanças” pelos ares têm um sabor especial para mim: cada voo é um desafio bem-sucedido. Jamais deixei que o pânico de altura paralisasse minha vida e meu crescimento profissional, a exemplo do que ocorreu naquele dia em um caramanchão do interior de São Paulo.

Adriane Fregonesi Froldi é diretora de atendimento da LVBA e participa de vários programas de milhagem, apesar do medo de avião.

*Segundo o dicionário Michaelis, caramanchão é: “Construção ligeira, para que nela se enrosquem trepadeiras, nos jardins ou pomares ou obra exterior avançada. Variação: caramancheio, caramanchel e carramanchão”.

Um comentário:

  1. Seguro a sua mão no voo de terça-feira!
    Pensa: se tiver escrito que vc passa dessa pra melhor, pode ser no ar ou no chão (e no chão pode ser de avião...). hahahaha

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